quinta-feira, 14 de junho de 2012

Teste drive


Eu estava com aquele olhar vazio de quem não observa o futuro? Apenas quebrei o salto. Uma cartomante poderia prever? Um trabalho poderia me salvar dessa? Mastiguei cada possibilidade de encontrar uma cola, uma carona. Não fui perseguida ou arrastada até lá. Senti um frio apertar minhas roupas, sem me seduzir antes. Durante ou depois. Qualquer ente vivente da madrugada poderia me ajudar. Seria aceitável? Mas só tínhamos, eu, um salto, um par de sapatos, um posto de gasolina e o frio e os meus olhos vazios.
Era o agora que me fazia me mexer. Sufocar algumas possibilidades frouxas e tentar me virar. Talvez mantive os olhos vazios. Sumi do mapa que nenhum fantasma poderia me ajudar. Quanto tempo iria durar essa madrugada? Estatelei mais uma vez de frio.

Desisti do salto.

Algumas luzes passavam e eu mesma não sabia o que faria. Acenaria? Topa um programa? Ou sobe ou desce.
Segurei firme os saltos na mão. Achei que se tivesse que ir, iria com tudo. Não consegui dá um passo: e se nenhuma luz alumiasse meu caminho? Quantas paradas por sombras deveria fazer? Quantas conseguiria? Vai que não seja tão claro que o sol volte amanhã.
Tremi de frio. Senti meus pelos se arrepiarem e que meus pés jamais caberiam novamente no salto. Ou mesmo meu corpo nessa roupa. Tudo estava estourando. Eu estava estourando tudo. Bombas de calibrar pneus. Bombas de gasolina. Bombas de gás lacrimogêneo.

Vou forçar o dia a raiar, pensei. Nem que pra isso eu sopre, sopre, sopre até as paredes de metal cair. Sou um cometa. Me vi inspirada a continuar. Manter o calor. Aquecer os peitos com os braços. Tirei da bolsa o perfume Maria Juana.
Cantei como um galo para que a alvorada passasse. Cantei por horas. Cantei até que os sonhos frouxos recobrissem sua dignidade. Dei saltos altos a eles todos. Subiram a serra comigo. E sem quebrar o salto. Mastiguei por horas as possibilidades jorrando dos sonhos. Estava inundada.
Cantei uma súplica cearense encarnando a própria Maria Madalena. Meus olhos ainda estavam vazios? Não poderia olhar para o futuro? Que peste me valeria um salto que quebrou? E o que ficou inteiro e sozinho? Ficou inteiro e sozinho.

Estirei as roupas para secar. O chão estava tão enlameado quanto eu inundada. Nenhuma luz alumiou o meu caminho? Não fui para fora. Vomitei todas as possibilidades mastigadas. Comi farinha e barro. Estremeci de frio. Coloquei as roupas secas. Recoloquei o salto. Fui, ao final.