Eu estava com
aquele olhar vazio de quem não observa o futuro? Apenas quebrei o salto. Uma
cartomante poderia prever? Um trabalho poderia me salvar dessa? Mastiguei cada
possibilidade de encontrar uma cola, uma carona. Não fui perseguida ou arrastada
até lá. Senti um frio apertar minhas roupas, sem me seduzir antes. Durante ou
depois. Qualquer ente vivente da madrugada poderia me ajudar. Seria aceitável?
Mas só tínhamos, eu, um salto, um par de sapatos, um posto de gasolina e o frio
e os meus olhos vazios.
Era o agora que
me fazia me mexer. Sufocar algumas possibilidades frouxas e tentar me virar.
Talvez mantive os olhos vazios. Sumi do mapa que nenhum fantasma poderia me
ajudar. Quanto tempo iria durar essa madrugada? Estatelei mais uma vez de frio.
Desisti do
salto.
Algumas luzes
passavam e eu mesma não sabia o que faria. Acenaria? Topa um programa? Ou sobe
ou desce.
Segurei firme os
saltos na mão. Achei que se tivesse que ir, iria com tudo. Não consegui dá um
passo: e se nenhuma luz alumiasse meu caminho? Quantas paradas por sombras
deveria fazer? Quantas conseguiria? Vai que não seja tão claro que o sol volte
amanhã.
Tremi de frio.
Senti meus pelos se arrepiarem e que meus pés jamais caberiam novamente no
salto. Ou mesmo meu corpo nessa roupa. Tudo estava estourando. Eu estava
estourando tudo. Bombas de calibrar pneus. Bombas de gasolina. Bombas de gás
lacrimogêneo.
Vou forçar o dia
a raiar, pensei. Nem que pra isso eu sopre, sopre, sopre até as paredes de
metal cair. Sou um cometa. Me vi inspirada a continuar. Manter o calor. Aquecer
os peitos com os braços. Tirei da bolsa o perfume Maria Juana.
Cantei como um
galo para que a alvorada passasse. Cantei por horas. Cantei até que os sonhos
frouxos recobrissem sua dignidade. Dei saltos altos a eles todos. Subiram a
serra comigo. E sem quebrar o salto. Mastiguei por horas as possibilidades
jorrando dos sonhos. Estava inundada.
Cantei uma
súplica cearense encarnando a própria Maria Madalena. Meus olhos ainda estavam
vazios? Não poderia olhar para o futuro? Que peste me valeria um salto que
quebrou? E o que ficou inteiro e sozinho? Ficou inteiro e sozinho.
Estirei as
roupas para secar. O chão estava tão enlameado quanto eu inundada. Nenhuma luz
alumiou o meu caminho? Não fui para fora. Vomitei todas as possibilidades
mastigadas. Comi farinha e barro. Estremeci de frio. Coloquei as roupas secas. Recoloquei
o salto. Fui, ao final.
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