quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Geração 3.0

O que fazer pra solucionar o problema desse homem? Eu estava esperando um ônibus. Pressa, correria, sufoco. Mais adiante pensei que quis dá uma chance. Desenganei minha esperteza e desiludi meu coração. Fiz ele se acalmar. Chamei o frio de preconceituoso. Achei o frio discriminador. O frio do meu estômago. Virei meu rosto contra isso. Guardei as armas no meu punho e escondi meu demônio.


Eu sufoquei meu demônio.



O ponto de ônibus no escuro, afastado, vigiado por arvores centenárias parecia um bosque. O homem  parecia um duende. Olhos vermelhos. Deu um saque pra verificar quem era eu. “Você mora onde?”. Onde eu moraria? “Nunca foi fácil responder essa pergunta”, pensei. Mas eu já tinha me entregado. Em alguns instantes passei pra ele minha carteirinha. Me olhou dos pés à cabeça. Não chegou muito perto. Me chamou de irmão e não de otário. Me senti apertado. Sumiram todos os lados da avenida e eu estava preso em cubo branco. Era o que estava escrito. 


Mãos na cintura: “Isso que tá aqui não é pra você”, me disse. 

Não sei o que esse duende quis me mostrar nesse momento. Não era um samba, não se tratava de um rebolado. Ele estava mostrando que o frio do Salvador tinha chegado. Era a hora de fazer qualquer coisa. E fui marionete de um duende. 

“Isso que eu tenho aqui não é pra você, não”. Conjurou um feitiço. “Tire o celular. Devagar! Rápido!”. Os dedos se embolaram procurando o equilíbrio dessa ação. Mais atrasado que uma trabalhadora às dez horas da manhã, queria que o ônibus chegasse logo. O ônibus chegaria como uma carruagem de guerra. Anunciada pela potência de seus cavalos. Me arrebataria daquele bosque e eu estaria longe em segundos. Mas nem as árvores balançaram suas folhas. Que outras forças estariam presentes ali, fazendo chacota de minha situação? Era uma vez um teste de coragem? Meus demônios estão lendo e tudo de mal que eu poderia fazer, ficou preso dentro de um cubo branco. A voz dele me arrebatou:


- Deixa eu ver!



Mostrei sem qualquer resistência. Achei que o duende não conseguiria nem duas pedras com o que viu. Cabia a mim, marionete em um bosque dentro de um cubo branco, questionar? O que eu faria para desconjurar um feitiço desses? Como resolver o problema desse homem?

- Vai querer ficar com um desses?, insinuei.



Ele disse “Quero sim”. O espirito do medo encarnou em meu corpo. Enquanto ele se afastava, não levantei meu rosto. "Meus demônios e ônibus, onde vocês estavam?". O ônibus chegou e deveria ir sem mim. 

Não dei um passo  para fora do cubo. Eu ainda estava lá. Preso.  

O duende gritou de longe “O que é?! Você tá duvidando, é?”. Surtiu o efeito de cortar os cordões da marionete. Foi como um parto. Pulei para dentro do ônibus. O cubo branco se resumiu nas portas do ônibus que me pensaram por um instante. Deslizei para dentro da cabine do cobrador. E não respirei aliviado. "Vai pra Barra?" - perguntei - ele não quis participar do meu sufoco. Não olhou na minha cara. Respondeu surdamente que eu estava no ônibus errado. Pulei para outro ponto. Entrei em outro.

Talvez o cobrador estivesse certo: estou no ônibus errado.  Cheguei ao ponto final.



- Quantos dragões você enfrentou pra chegar aqui?



- Apenas um. E levou meu celular. 

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